08 dezembro 2010

Que Fazer ?

A História é o lugar da queda, mas também da redenção. Há pessoas que pensam, há pessoas que agem e há pessoas que pensam e agem. Goethe dizia que "No principio era a ação", desse agir levado pelos impulsos mais secretos ou instintos mesmo, que permitem um agir intuitivo. Os que pensam são racionais, os que agem diretamente são intuitivos; às vezes os intuitivos acertam, às vezes os racionais acertam. Mas ambos se igualam em uma coisa: querem agir. Não querem ficar indiferentes à realidade; para ambos ela é a matéria plástica onde os sonhos se moldam. Para o bem ou para o mal, o importante é agir. Deus vomita os mornos, já nos disse Dante. A indiferença é um sintoma do mais extremo egoísmo ou tibieza. Não falo dos contemplativos, porque a contemplação é também uma forma de ação que se justifica numa visão de mundo. Falo daqueles que ficam inertes na mais completa indiferença frente às coisas, as pessoas, o mundo.
Sou, antes de tudo, poeta. É através da poesia que enxergo o mundo. Há muito tempo não publico livros de poesia; isso não importa; continuo produzindo, publicando na blogsfera (a esfera da manhã), porque é a poesia quem me alimenta, é ela quem garante meu pão, é ela quem salva meus olhos, é ela quem lubrifica minha garganta, é ela quem move minha mão em direção às flores, ventos, à pele das mulheres, às curvas das folhas e dos seios, é ela quem sabe meu nome, é ela quem  me permite enxergar as pessoas além do véu da aparência social, além dos seus papeis previamente determinados. 
A política para mim é uma tentativa de realizar a esfera da poesia; não sou ingênuo quanto a isso; nesses poucos anos em que estou no movimento sindical (desde 2006, como dirigente), vi que o pragmatismo impera e que os antigos ideais são abandonados em nome de interesses diretos pelo poder puro e simples com tudo o que ele representa; vi que não há democracia real em lugares onde esperávamos no mínimo uma tentativa de democracia direta. Os embaraços criados por aqueles que dirigem o movimento para não permitirem críticas e/ou transformações na estrutura e na forma de organização do movimento sindical é um capítulo à parte e que figurará na história como mais um triste episódio da mesquinhez planejada da sanha pelo poder. Me refiro diretamente às chamadas centrais governistas, que durante oito anos travaram o movimento sindical para que o mesmo não avançasse em direção a ações revolucionárias, para que não se criasse embaraços ao governo Lula.
Na última eleição para presidente, declarei apoio crítico à candidatura de Dilma Roussef movido principalmente pelo fato de que uma direita ainda mais retrógrada começava a ganhar a possibilidade de voltar ao poder via José Serra, fato que até o senador Aécio Neves, do PSDB, reconheceu como um elemento negativo da campanha. Mas fiz questão de cifrar que era um apoio crítico, porque sabia que, ganha a eleição, o movimento sindical ficaria em polvorosa atrás de cargos, movidos por interesses  que não são os dos trabalhadores, mas os de uma elite dirigente que não refletem aquilo que a classe trabalhadora espera,
Então, o que fazer ? Não consigo ficar no imobilismo. Sonho ainda não com um "Estado Proletário", mas com uma sociedade livre onde mulheres e homens tenham os mesmos direitos a ter aspirações e sonhos, onde não haja opressão do homem pelo homem. Recordo-me com prazer de um trecho do livro ARCANO 17, onde Breton recorda de uma manifestação contra a guerra, ainda em 1917, onde ele ainda jovem viu um mar de bandeiras vermelhas e negras, onde muitos dos que ali estavam eram sobreviventes da Comuna de Paris, herdeiros daquele que fora o maior sonho de um mundo novo. Agora, sonhamos com os pés no chão, mas com o amparo da poesia, para que não caíamos na tentação absolutista, nem no mais tosco materialismo que é incapaz de diferenciar o sonho da sua forma, e fica enredado na aparência das coisas, quando já sabemos que o aparente não é necessariamente o real.
Por isso, porque a poesia me chama com voz de lobo, com suas mãos de sereia, porque ainda acredito no humano, na nossa vontade de construirmos o belo, de superarmos as antinomias não à base da força, mas da inteligência, insisto na ação, na ação livre, ética, pensada ou não, intuitiva ou racional, mas na ação, nos caminhos que procuramos desenvolver para chegarmos à  liberdade. O capitalismo é um óbice à liberdade; a luta para imaginar um outro lugar, um outro mundo não parte de pressupostos irreais, mas na necessidade de salvar o planeta da lógica destrutiva do capital. O momento é de atenção: a crise mundial empurrará o Brasil para um cenário mais recessivo, de corte de gastos, mas também para um cenário de dúvidas e incertezas para a classe trabalhadora. Sou um trabalhador, desses artesãos antigos que se debruçavam sobre a palavra como quem olha não a pedra bruta, mas os ventos que se enredarão para fazer soar a harpa, como aquele que tece guirlandas de sonhos e sai a coroar mulheres e crianças com a esperança, daqueles que, tomados pelo fogo mais secreto, desbastam a matéria bruta para assim fazerem surgir a obra incompleta, que só espera o gesto de quem olha para poder viver.
Então, me afastarei desses meios stalinistas onde a liberdade é uma fábula, onde o controle sobre o pensar e o falar ganha sutilezas cada vez mais terríveis, como a mão de um esqueleto a depositar um véu sobre as coisas, um véu transparente de chumbo que pesa sobre os olhos e faz adormecer, mas não desistirei da luta, não deixarei de agir, ainda que por caminhos tortuosos e sendas estreitas como é a senda de todo poeta; não posso pular para fora da história nem ficar indiferente olhando as coisas como se o mundo inteiro fosse uma paisagem de Turner.

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